Continuação de No Elevador e Depois
Desço até meu carro. Antes de sair do elevador, que outra vez foi parando de andar em andar, conto até 3. Levanto o pé direito e pulo para fora do elevador. Manias, manias, manias. Ando em linha reta e depois viro à esquerda. Lá está o meu carro, na velha vaga de sempre. Me esperando.
Ouço barulhos abafados de motores roncando em andares inferiores e superiores a esse subsolo de garagem. Ruídos também abafados de conversas. Pessoas rindo, outras conversando ... Nada além de sons fantasmagóricos a reverberar no concreto frio e escuro. As passadas dos meus pés também produzem um som característico, que eu gosto de ouvir. O toque do calçado sobre o concreto me faz lembrar algo controlável, algo ritmado. E assim vou até minha vaga.
Perto do carro, algo me chama a atenção. Paro, a coisa de uns 3 metros do carro. Procuro escutar e observar. Alguma coisa parece errada ... Olho embaixo do carro e há uma poça. Pequena, mas há.
Seria água do radiador? Teria ele se quebrado? Óleo, talvez? Óleo de freio? Não ... apesar do meu gênio intragável, admito, não acho que alguém iria querer me matar. E mesmo nesse instante fica patente minha covardia. Se tenho tanta preocupação de que alguém possa vir me matar ou criar uma situação onde eu morra, como fiquei pensando em me jogar do 17o andar hoje? Imagino não ser nada aquela poça abaixo do meu carro e me concentro em achar a chave do carro dentro do bolso.
Ponho a mão e vasculho o bolso. Encontro-a e puxo-a para fora. Aperto o controle do alarme e, com dois silvos rápidos, o carro está destravado.
Ao entrar, meus dedos novamente ficam tiritando no volante do carro. A velha adrenalina de sempre. Tanto para vir quanto para voltar, ela tem de aparecer nesses momentos. Respiro fundo. O frio me corta a espinha. Nada demais. De manhã eu sentira a mesma coisa.
Mas daquela vez o frio era diferente. Algo me fez pensar em minha vida e de como eu era menos solitário quando casado, ainda que não completamente feliz. Filhos, não os tive. Apenas esposa.
Fomos felizes por um tempo, mas depois as coisas começaram a ficar estranhas. À medida que nos distanciávamos, o casamento ia minguando, pouco a pouco ... Ao me dar conta, percebi que só via minha esposa nos finais de semana. Durante a semana acordava depois dela e chegava em casa apenas após ela já ter ido dormir. Não a acordava para não incomodá-la. Tenho certeza que ela agradecia o meu "cuidado", já que também ela, com certeza, não gostaria de ser acordada. Ainda mais para conversar.
Aliás, conversar sobre o que? Conversar sobre o tempo? A vida? Que vida! A última conversa que tive com ela foi através do meu advogado no caso da separação e consequente divórcio.
Lá se vão alguns anos desde que a vi pela última vez. Hoje, estranhamente, pensei nela o dia inteiro, entre uns afazeres e outros.
Com isso em mente, decidi seguir até a casa dela. Queria encontrá-la, perguntar coisas que não pude perguntar antes, por falta de tempo ou qualquer outra desculpa que eu queira dar a mim mesmo.
Sai com o meu carro às 21:54 do estacionamento. Talvez fosse um mal presságio, já que meu horário costumeiro não era aquele. Bem, decidi arriscar e me dirigi para aquele suburbio onde eu soube ela morava.
2 comentários:
hum,isso está ficando realmente inquietante.Parece o pesadelo de alguém.O seu,arriscaria dizer...
esse 17° andar me lembra do sétimo andar do los hermanos... hahahahah... e o horário em q ele saiu de carro do estacionamento me lembra 12:51 dos strokes... heuheuheue... músicas me parecem presságios...
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