sábado, fevereiro 17

Vento, Chuva e Fantasia


O guarda-chuva voou para longe. Ela correu para abrigar-se. Por que essa chuva agora, quando só existia o velho celeiro como refúgio? O frio fazia-lhe tiritar, o vento assobiava forte, impassível, açoitava-lhe as pernas, fustigava-lhe as forças. Não tardaria a anoitecer e a tempestade a obrigaria a passar a noite ali.

O aspecto do celeiro não podia ser pior. Mesmo por suas histórias de fantasmas e ainda cercado de capim alto, cheirando a madeira podre (e coberta de orelhas-de-pau), muita sujeira e abandono... Algumas trepadeiras aqui e ali subiam pelas paredes de pedra e seguravam as janelas e portas, em outros pontos formavam uma sebe de flores lilases interligando bancos e tornos onde um dia foi um pátio. Entremeios, a ferrugem corroia arados expostos às eras...

Ela empurrou com força a um dos lados da enorme porta, a mais perto do riacho e do moinho do celeiro, a mais encoberta pelo mato alto. Sentiu a madeira estalar e tremer. As velhas paredes de pedra resistiriam a tempestade, quanto à madeira, não havia certezas. Diziam ter sido muito bonito ali. E movimentado também. Afinal todos precisavam da moenda e não havia outro lugar em mais de 10 léguas em qualquer direção. Há mais de seis décadas isso. Poucos os que lembravam. Isso antes dos homens das fabricas surgirem e comprarem todos os grãos.

O ar era fétido, pesado. Mas a lufada de vento que entrou com ela – e com a tempestade- trouxe dos campos o frescor das ervas contentes pela chuva e o cheiro de terra molhada. As paredes pareceram suspirar ante o inusitado presente. Parada, as mãos estendidas a um lado da porta, a menina pensava se valia entrar. Seus olhos divisavam na escuridão sombras de carroças, restos de barris velhos e algo que um dia poderia ter sido feno (um velho e seu cavalo viveram ali até o verão passado, quando a família do ancião surgido do nada apareceu na vila em busca de seu patriarca que desaparecera...).

Celeiro, celeiro... Nome estranho. Conhecia da escola sua origem latina, mas o nome lembrava-lhe vagamente algo nórdico. Homens e mulheres armazenando comida para fugir das mãos gélidas do inverno (que ela sempre imaginou como uma mulher, pois só as mulheres são capazes de tantas fúrias e impiedades verdadeiras). E agora, ele abria-lhe as portas, acolhendo-a, abraçando-a. Era só uma noite. Não iria temer.

2 comentários:

Anônimo disse...

um celeiro... um vento...

chuva.

[deu um sono...]

a madeira e as velhas paredes teriam ainda muito o que contar...

e os passeios debaixo de um guarda-chuva então?

porém "a menina pensava se valia entrar".


perfeito!!!

pq q eu não li antes???

^^

bjos

Unknown disse...

celeiro.

abrigo, depósito, lugar quente, me lembra tudo isso também. um texto distante, parece que chuvisca e a tela do computador está´beeem longe...

leve.

^^